TRANSFORMAĆĆO DIGITAL
- Felipe Beck
- 26 de jul. de 2020
- 10 min de leitura
Atualizado: 27 de jul. de 2020
Uma exploração da principal tendĆŖncia empresarial promovida pelo ānovo-normalā

O momento demanda das empresas se ajustarem a novos formatos, menos fĆsicos e presenciais, mais low-touch e digitais. E nĆ£o Ć© por menos: lĆderes em maturidade digital no mundo apresentam desempenho superior, com taxa de crescimento de EBITA atĆ© 5 vezes maior em comparação Ć s demais empresas - segundo dados da pesquisa McKinsey Analytics and Digital Quotient.
Mas afinal, o que caracteriza uma transformação digital?
TransformaƧƵes digitais podem ser caracterizadas por acionar ao menos uma de quatro alavancas-chave de valor:
(i) Modelos de negócio (novas formas de operar e novos modelos econÓmicos);
(ii) Conectividade (engajamento em tempo real);
(iii) Processos (foco na experiência do cliente, automação e agilidade); e
(iv) Analytics (melhor tomada de decisão e cultura de dados).
Para capturar o valor criado por essas alavancas, é necessÔrio associÔ-las a um conjunto de melhores prÔticas de gestão que abrangem quatro dimensões fundamentais:
(i) EstratƩgia;
(ii) Capacidades;
(iii) Organização; e
(iv) Cultura.
Convido vocĆŖ a explorar a maturidade estas 4 dimensƵes, Ć partir de reflexƵes baseadas no documento TransformaƧƵes digitais no Brasil: insights sobre o nĆvel de maturidade digital das empresas no paĆs da McKinsey & Company.

Fonte do Quadro 1: Analytics and Digital Quotient by McKinsey
1- ESTRATĆGIA
As empresas em geral, mesmo aquelas com maturidade digital menos desenvolvida, têm consciência da relevância e do potencial de disrupção do Digital e Advanced Analytics.
As empresas lĆderes tendem a mudar de forma significativa sua estratĆ©gia corporativa e investir mais na digitalização.5 Mas uma transformação digital eficaz requer uma estratĆ©gia capaz de aliar uma visĆ£o ambiciosa com uma perspectiva holĆstica das aƧƵes e mensuração clara dos resultados. AlĆ©m disso, a comunicação frequente da história da transformação e da estratĆ©gia digital sĆ£o fatores que alavancam o sucesso da transformação dessas empresas ā segundo um estudo realizado pela McKinsey em 2018, as organizaƧƵes globais que adotam essas prĆ”ticas tĆŖm probabilidade 3 vezes maior de serem bem-sucedidas em sua transformação.
As demais empresas, contudo, tendem a ter uma visão mais voltada à interface com o cliente, na qual o digital é um pilar adicional da estratégia.
Potencial de disrupção de Digital e Advanced Analytics:
Consciência da mudança
Aspiração ambiciosa e de longo prazo
Vinculado à estratégia de negócio
Centralidade do Cliente
Oportunidades de crescimento
Roadmap especĆfico
2- CAPACIDADES
As empresas investem em marketing digital e na melhoria da jornada do cliente em geral, mas as capacidades analĆticas ainda sĆ£o um desafio.
Além de uma estratégia clara, é essencial que as empresas desenvolvam capacidades de sustentação da mudança, tais como uma base robusta de dados e informações para definição e acompanhamento estratégico; modelos e ferramentas que viabilizem a geração de insights sobre o negócio e aumentem a eficiência e a produtividade; entendimento abrangente da experiência do cliente em toda a sua jornada e habilidade para aprimorÔ-la por meio da personalização de produtos e serviços; bem como aumento do engajamento digital de seus clientes e parceiros com o uso de técnicas de marketing digital.
As jornadas de cliente e a melhoria da experiĆŖncia parecem ser conceitos disseminados na grande maioria das empresas participantes da pesquisa. Nesse sentido, as prĆ”ticas distintivas envolvem tambĆ©m a personalização da experiĆŖncia do cliente e a disseminação do uso de ferramentas de autoatendimento. As empresas de destaque contam com recursos dedicados ao mapeamento das jornadas ponta a ponta e dos principais pontos crĆticos para os clientes, o que lhes permite desenhar novas jornadas considerando nĆ£o apenas o feedback dos clientes, mas tambĆ©m desenvolvendo o desenho juntamente com eles (design thinking).
No que se refere Ć s prĆ”ticas de marketing digital, as empresas jĆ” dedicam parcela significativa dos recursos de marketing Ć s mĆdias digitais, mas na mĆ©dia ainda as consideram mais como uma ferramenta para aumentar awareness de marca do que como uma maneira de otimizar os gastos de Digital marketing com maior foco em vendas e ligação direta com resultado. Para acompanhar o desempenho de seus representantes, realiza-se um ranking de campanha com alavancas de gamificação.
As empresas investem em marketing digital e na melhoria da jornada do cliente em geral, mas as capacidades analĆticas ainda sĆ£o um desafio. As dimensƵes sĆ£o:
Marketing e vendas digitais Fonte: Pesquisa A&DQ Brasil
Dados e Analytics
Organização
Jornadas do cliente
Modelos e plataforma tecnológica
Foco na geração de valor
3 - ORGANIZAĆĆO
As empresas de maior destaque tĆŖm estrutura e governanƧa eficazes para implementar a transformação digital ā talentos e disseminação do conhecimento ainda sĆ£o desafios.
Ć importante avaliar se a estrutura de digital e analytics da empresa estimula a colaboração eficaz e eficiente entre unidades de negócio, independentemente do grau de centralização, se existem KPIs claros de performance relacionados a prioridades estratĆ©gicas em digital e analytics e se eles sĆ£o monitorados de forma contĆnua e sistemĆ”tica pela empresa. TambĆ©m vale avaliar a habilidade para atrair, desenvolver e reter talentos de alto nĆvel em digital e analytics, bem como a existĆŖncia e proficiĆŖncia de funƧƵes crĆticas que viabilizem a comunicação e o entendimento entre as funƧƵes de especialistas de tecnologia e do negócio.
A estrutura organizacional das empresas participantes no Brasil é uma das prÔticas com maior variabilidade quanto à maturidade. Embora não haja uma estrutura única capaz de gerar mais impacto que outras, a experiência da McKinsey em transformações permitiu identificar estruturas recorrentes, sendo as quatro principais:
Organização digital Ôgil;
Unidade de negócio digital independente;
Grupo digital holĆstico;
Centro de excelĆŖncia.
Naturalmente, o que define a diferenciação entre as organizaƧƵes Ć© o entendimento dos lĆderes acerca dos trade-offs entre os arquĆ©tipos, sendo que a escolha do modelo a seguir deve basear-se nas necessidades e no nĆvel de maturidade digital de cada empresa. Contudo, no longo prazo, alcanƧar uma organização na qual o digital e o restante do negócio sejam indistinguĆveis ā e inseparĆ”veis ā deveria ser a meta.
Estruturas especializadas facilitam a responsabilização pela estratégia digital, viabilizam a avaliação de trade-offs transversais e asseguram o envolvimento dos altos executivos da empresa.
Em termos da prĆ”tica de governanƧa, Ć© importante ter visibilidade, fóruns de acompanhamento frequentes e formais para garantir uma governanƧa eficiente. Da mesma forma, o reforƧo de comportamentos desejados por meio de mecanismos formais (por exemplo, incentivos) Ć© uma prĆ”tica essencial em grandes transformaƧƵes. A alta gerĆŖncia Ć© responsabilizada pelo sucesso das iniciativas com mecanismos formais de incentivo (por exemplo, bonificação) atrelados ao progresso da transformação digital. Um dos desafios, entretanto, Ć© disseminar os incentivos da alta gerĆŖncia a todos os nĆveis de maneira coerente, levando em conta as necessidades de curto prazo do negócio tradicional.
Outro aspecto fundamental é a escassez de talentos, citada por executivos no mundo todo como uma das principais barreiras à execução de uma transformação digital. No Brasil não é diferente: no intuito de suprir a necessidade de talento qualificado, as empresas têm investido em distintas alavancas como revisão do modelo de atração e recrutamento, capacitação da força de trabalho, parcerias e terceirização. Contudo, as empresas indicam que não têm conseguido atrair o talento qualificado de que precisam. Para abordar esta questão, muitas empresas no Brasil têm buscado aproximar-se de start-ups como meio de aprendizado e inovação das dinâmicas de atração, recrutamento e retenção. Embora esta dinâmica esteja em linha com aquelas observadas no restante do mundo, a melhor solução para a estratégia de recrutamento deveria incluir a adoção de um mix de métodos tradicionais (por exemplo, anúncios, head hunters) e não tradicionais (por exemplo, prospecção em comunidades de inovação, eventos de tecnologia).
O talento digital ideal Ć© fruto de uma combinação de habilidades tĆ©cnicas e funcionais com qualidades comportamentais e de lideranƧa para conseguir gerar impacto no negócio, e muitas empresas de destaque na pesquisa estĆ£o suprindo a necessidade de talentos digitais por meio de parcerias ou terceirização de funƧƵes. No entanto, a forma mais eficaz de desenvolver habilidades digitais Ć© por meio de capacitação e treinamento com tĆ©cnicas de aprendizagem experimental ā adultos aprendem melhor colocando em prĆ”tica o que sabem, por isso a capacitação deve combinar teoria e prĆ”tica.
PrÔtica da dimensão de Organização:
Estrutura;
Colaboração entre negócio e tecnologia;
Talentos;
ProficiĆŖncia em Analytics e Digital;
GovernanƧa e mƩtricas.
4- CULTURA
Empresas que adotam desenvolvimento Ôgil, aliado a um maior apetite por inovação, tendem a apresentar melhor desempenho em cultura digital.
A cultura Ć© fundamental para a geração de valor em uma transformação digital, mas a maioria das empresas enfrenta desafios nesta dimensĆ£o. De fato, a cultura Ć© citada por executivos como a barreira ānĆŗmero 1ā Ć entrega de impacto em iniciativas digitais. No contexto de uma transformação digital, a mudanƧa cultural envolve alguns elementos crĆticos, tais como:
ā Agilidade: ritmo diferenciado na tomada de decisĆ£o e na execução das principais iniciativas digitais;
ā Teste e aprendizado: existĆŖncia de estrutura, processos e sistemas para promover metodologias de teste e aprendizado (ou Testes A/B), com iteraƧƵes rĆ”pidas nas iniciativas de digital e analytics;
ā Experimentação: maior conforto na exposição a riscos referentes a iniciativas de digital e analytics, porĆ©m de forma controlada;
ā Colaboração interna: equipes multifuncionais altamente comprometidas que colaboram com eficĆ”cia no desenho e na implementação de soluƧƵes de digital e analytics;
ā Mentalidade baseada em dados: rigorosa cultura de tomada de decisƵes baseadas em dados em Ć”reas de negócio estratĆ©gicas, tĆ”ticas e operacionais;
ā Orientação externa: entendimento aprofundado do mercado competitivo e flexibilidade na busca por soluƧƵes e parcerias externas quando se trata de promover a capacitação em digital e analytics na empresa e/ou para atividades nĆ£o essenciais.
Transformar a cultura de uma empresa requer uma mudanƧa nas mentalidades e comportamentos em todos os nĆveis da organização. Isso somente Ć© possĆvel alavancando simultaneamente os quatro elementos do chamado āModelo de influĆŖncia":
ā Role modeling: refere-se Ć forma como a lideranƧa serve de exemplo a ser seguido;
ā Incentivo ao entendimento e Ć convicção: diz respeito a criar uma história da transformação e comunicĆ”-la com frequĆŖncia;
ā Desenvolvimento de talentos e habilidades: relacionado Ć capacitação em habilidades tĆ©cnicas e de relacionamento, assim como aquisição de novos talentos;
ā Mecanismos de reforƧo: referem-se Ć s estruturas, sistemas, processos e incentivos Ć estratĆ©gia.
Grande parte das empresas tem consciência das mudanças que acarretam uma cultura digital. No entanto, a agenda de transformação digital muitas vezes se depara com hÔbitos antigos e iniciativas que visam buscar resultado financeiro imediato causando conflitos e eventual falta de alinhamento entre as Ôreas, o que desestimula investimentos de longo prazo na mudança de mentalidades e comportamentos (em certo caso, a Ôrea de digital em construção precisou ser reduzida para atender uma iniciativa transversal de eficiência da empresa).
Pequena parte das empresas e trabalham eficazmente com equipes Ć”geis multifuncionais. Dentre elas, algumas equipes integradas estĆ£o trabalhando com agilidade apenas em iniciativas diretamente associadas com temas digitais (por exemplo, novos canais digitais), enquanto algumas poucas empresas jĆ” estĆ£o aplicando o modelo Ć”gil em escala, alcanƧando atĆ© 60-80% de seu desenvolvimento em ambiente Ć”gil. Ter como princĆpio bĆ”sico a ideia de que āsó nĆ£o pode errar sem aprenderā e busca codificar e disseminar os aprendizados de cada experiĆŖncia, por exemplo, realizando diversos testes A/B com registro detalhado dos resultados, Ć© uma prĆ”tica a ser seguida.
Alternativamente, a busca por capacidades externas (parcerias com start-ups, por exemplo) surge como uma porta de entrada comum para o desenvolvimento da transformação digital. As empresas lĆderes entrevistadas, porĆ©m, parecem recorrer menos Ć captura de capacidades externas e a parcerias com terceiros. Empresas maduras entendem quais atividades sĆ£o essenciais e o que deveria ser feito internamente ou terceirizado, mas o maior desafio Ć© justamente entender āo que Ć© essencialā, uma vez que a definição pode mudar conforme a Ć”rea ou o momento da transformação. Por exemplo, atualmente Ć© comum ver a mĆdia programĆ”tica (anĆŗncios automatizados e direcionados online, entre outros) internalizada, enquanto a mĆdia de conteĆŗdo (produção de conteĆŗdo para divulgação institucional da marca) Ć© terceirizada, mas isto nĆ£o foi sempre verdadeiro.
PrÔticas da dimensão de Organização:
Agilidade
Teste e aprendizado
Experimentação
Colaboração interna
Mentalidade baseada em dados
Orientação externa
Após explorarmos as 4 dimensões fundamentais da Transformação Digital, lhe convido a conhecer os 5 principais insights do estudo:
(i) Os lĆderes digitais tambĆ©m apresentam melhor desempenho financeiro
(ii) A pontuação de maturidade dos lĆderes digitais no paĆs estĆ” próxima Ć dos lĆderes globais, mas hĆ” grande disparidade de maturidade entre as empresas pesquisadas
(iii) As empresas lĆderes reconhecem a natureza complementar das prĆ”ticas e se destacam nas trĆŖs mais desafiadoras segundo o estudo, enquanto as de menor maturidade desenvolvem prĆ”ticas pontuais, de forma isolada. As trĆŖs prĆ”ticas de transformação digital avaliadas como as mais desafiadoras sĆ£o:
ā Estrutura organizacional,
ā Experimentação,
ā Jornada do cliente.
As empresas com menor maturidade digital, por sua vez, conseguem priorizar um conjunto de quatro prĆ”ticas ābĆ”sicasā ou prĆ©-requisitos para iniciar uma transformação digital:
ā ConsciĆŖncia da mudanƧa,
ā Orientação externa,
ā Centralidade do cliente.
(iv) Grande parte das empresas pesquisadas enfrenta desafios em quatro prÔticas da transformação digital:
ā Roadmap especĆfico de iniciativas, que seja ambicioso, priorizado e alinhado nos diferentes nĆveis da empresa, servindo de base para a estratĆ©gia de digital e analytics.
ā Dados e analytics capturados estruturadamente e integrados via infra-estrutura robusta que fornecem uma visĆ£o 360o sobre o cliente e utilizados para apoiar a tomada de decisƵes em todas as Ć”reas da empresa de maneira regular
ā Talentos identificados, capacitados e retidos na quantidade necessĆ”ria e que estejam preparados para um modelo de negócio mais digital e analĆtico.
ā Mentalidade baseada em dados com o desenvolvimento de uma rigorosa cultura de tomada de decisƵes objetivas em nĆvel estratĆ©gico, tĆ”tico e operacional nas Ć”reas de negócio.
(v) A maturidade e a velocidade de transformação das empresas estĆ£o correlacionadas ao setor da economia a que pertencem. Duas hipóteses explicariam esta homogeneização nos nĆveis de maturidade digital, (i) criação de um diferencial competitivo relevante para as empresas mais avanƧadas, levando as outras a se movimentarem no sentido de avanƧar em sua transformação digital, ou (ii) esses setores estĆ£o mais próximos do ponto de inflexĆ£o, criando um diferencial competitivo relevante para as empresas mais avanƧadas em digital. No Brasil, trĆŖs setores claramente despontam em maturidade digital (pontuação acima da mĆ©dia geral): ServiƧos financeiros, Varejo, e TelecomunicaƧƵes e Tecnologia āprecisamente, estes sĆ£o os setores mais afetados pelas mudanƧas de comportamento e necessidades do cliente, bem como pela dinĆ¢mica competitiva. AlĆ©m disso, sĆ£o os setores que se encontram mais próximos do ponto de inflexĆ£o de maturidade digital, no qual as empresas lĆderes definem o ānovo normalā de um setor, fazendo com que as empresas defasadas em sua transformação corram maior risco de se tornarem obsoletas.
O momento demanda das empresas se ajustarem a novos formatos, menos fĆsicos e presenciais, mais low-touch e digitais. Ć um caminho sem volta, cujo timing de sua adoção pode impactar diretamente o nĆvel de competitividade e atĆ© existĆŖncia do seu negócio. Neste contexto, permita-me lhe dar uma dica, esta seria: seja protagonista do seu próprio futuro, e faƧa isso investindo no seu processo de transformação digital.
Fontes:
- Pesquisa McKinsey Analytics and Digital Quotient. - TransformaƧƵes digitais no Brasil: insights sobre o nĆvel de maturidade digital das empresas no paĆs da McKinsey & Company.